Teatro da Trindade põe em cena “Sombras” sobre possibilidade de crescer em democracia
Teatro da Trindade põe em cena “Sombras” sobre possibilidade de crescer em democracia
Lisboa, 15 set 2024 (Lusa) — Uma mãe e uma filha com perspetivas completamente diferentes do que é ser “uma boa mãe” em plena ditadura dominam a ação da peça “Sombras”, a estrear-se na próxima quinta-feira no Teatro da Trindade, em Lisboa.
A mãe assimilou os modelos de família do Estado Novo, e a filha, casada com um preso político e mãe de uma recém-nascida, vê-se obrigada a regressar à casa materna, com o marido detido. Em causa, está o que é melhor para o futuro dos filhos, com a certeza de que a possibilidade de crescer livremente nunca está garantida, seja no Portugal da ditadura, seja em qualquer outro tempo da História, “no mundo inteiro”.
“Sombras”, escrita por Miguel Falcão, venceu a 6.ª edição do prémio Miguel Rovisco — Novos Textos Teatrais, promovido pelo Teatro da Trindade, e encontra-se ligada a “23 Segundos”, peça do mesmo autor estreada em maio último pela Comuna – Teatro de Pesquisa, já que o marido da filha é um dos presos políticos dessa obra.
Encenada por Ana Nave e interpretada por Carla Maciel e Mafalda Marafusta, “Sombras” põe em cena as visões antagónicas da sociedade e da família, com a filha a sonhar uma vida em liberdade e democracia.
“Por um lado, há uma mulher, a mãe, mais conservadora, que defende valores muito antigos, de uma época de Estado Novo em que se fala de qual é o lugar e o papel da mulher na sociedade e sobre como é que as mães devem ser”, disse Ana Nave à Lusa.
Por outro, acrescentou, temos uma filha desejosa de um mundo completamente diferente daquele com que a mãe se identifica, “e que precisa de mudar essa mentalidade para poder ver a filha crescer em liberdade e em democracia”.
Para a encenadora, o que acontece nesta peça é que, a partir de uma situação histórica em Portugal, a peça “transbordou de um texto português sobre a nossa história para o mundo inteiro”.
Afinal, “em todos os lugares, até onde menos se espera, há sombras, diferentes sombras”, há liberdades em causa, “modos de censura e repressão”.
E “continua a haver pessoas a lutar — e muitas são mulheres — para serem livres, para viverem em democracia, para verem os filhos crescer livremente”, frisou Ana Nave.
Outra das questões abordadas na peça tem a ver com o sacrifício pessoal de muitos em nome de um bem coletivo, sacrifício que, muitas vezes, faz “pôr em causa a própria vida” de quem não se conforma, observou Ana Nave.
A filha, coprotagonista de “Sombras”, por exemplo, é figura central na fuga dos cinco presos políticos de “23 Segundos”, a anterior peça de Miguel Falcão.
“Todas as questões levantadas [em ‘Sombras’] consistem em saber o que é melhor para os nossos filhos”, disse Ana Nave, sublinhando que, apesar de ter havido grandes conquistas nos 50 anos posteriores à Revolução dos Cravos, “nada é garantido”.
“Por isso, há que continuar muito atento e a lutar para que os valores da democracia e liberdade se mantenham de pé”, sustentou.
“Sombras” vai ficar em cena na sala Estúdio do Teatro da Trindade a partir da próxima quinta-feira, dia 19, até 03 de novembro, com récitas de quarta-feira a domingo, às 19:00.
A cenografia é de Rui Francisco, o desenho de luz de Tasso Adamopoulos, o desenho de som de Miguel Mendes e conta com ‘voz off’ de Ana Saltão e Catarina Guerreiro.
A 13 de outubro, haverá uma conversa com o público.
“Sombras” tem produção conjunta do Teatro da Trindade/Inatel e da RTP.
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Lusa/fim